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Sobre a Autora 

Fátima Diniz Castanheira é advogada em São Paulo, especializada em Direito dos Contratos e pesquisadora independente da previdência complementar patrocinada – fundos de pensão.

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Retificação de partilha

O erro na partilha impede o registro e inviabiliza a venda imediata do imóvel através de escritura pública. Muitas vezes o vendedor protocola o formal de partilha no Registro de Imóveis, mas em lugar do título registrado recebe a nota de devolução.


Por tratar-se de um título judicial, esse tipo de ocorrência costuma causar perplexidade nas pessoas. Contudo, não há motivo para o espanto porque a partilha é um título translativo da propriedade imóvel e, assim como os contratos, pode conter erros.


O Registrador tem o dever legal de examinar todo título apresentado, não só quanto à regularidade formal, mas, sobretudo se foram observados os princípios do Direito Registral como o da Princípio da especialidade e o Princípio da continuidade registral. O Princípio da especialidade objetiva diz respeito à perfeita descrição e individuação do imóvel; a especialidade subjetiva exige a perfeita qualificação das partes contratantes. O Princípio da continuidade exige o encadeamento dos atos registrais em ordem cronológica. Assim, todos os títulos apresentados a registro passam por esse crivo denominado qualificação registral, pouco importando a natureza dos mesmos, se contratos particulares, escrituras, partilhas judiciais ou extrajudiciais.


A retificação da partilha judicial deve ser processada nos próprios autos do inventário. O pedido a ser formulado é o de retificação da peça processual onde ocorreu o erro (primeiras ou últimas declarações, plano de partilha) e aditamento do formal de partilha nos casos em que este já tenha sido expedido, ensina o Desembargador José Osório de Azevedo Júnior no Agravo de Instrumento 0007073-97.1998.8.26.0000 de 17/12/1998 – TJSP. Por isso, nos casos de partilha antiga será necessário o desarquivamento dos autos.

Eis os termos da lei:


Lei nº 13.105/2015 – Código de Processo Civil (artigo 1.028 do CPC antigo):

Art. 656. A partilha, mesmo depois de transitada em julgado a sentença, pode ser emendada nos mesmos autos do inventário, convindo todas as partes, quando tenha havido erro de fato na descrição dos bens, podendo o juiz, de ofício ou a requerimento da parte, a qualquer tempo, corrigir-lhe as inexatidões materiais.


Em que pese o fato de a lei referir-se apenas a “erro de fato na descrição dos bens”, é possível ainda a correção em outras situações como a retificação da qualificação das partes ou o erro na atribuição da herança. A propósito, o Tribunal de Justiça de São Paulo já decidiu alguns desses casos:


0023270-73.2011.8.26.0000 Agravo de Instrumento

Relator(a): Pedro Baccarat

Data do julgamento: 16/03/2011

Ementa: Aditamento de formal de partilha para suprir falha existente que inviabiliza a transcrição da transmissão junto ao Cartório de Registro de Imóvel. Herdeiros maiores e capazes. Único bem partilhado igualmente entre os nove herdeiros. Recurso provido para admitir o aditamento na forma requerida.


9034320-21.2003.8.26.0000 Agravo de Instrumento / ARROLAMENTO DE BENS

Relator(a): Roberto Mortari

Data de registro: 30/12/2003

Ementa: Partilha - Pedido de retificação - Erro material que está a impedir o respectivo registro – Deferimento. Possibilidade.


9035374-51.2005.8.26.0000 Agravo de Instrumento / ARROLAMENTO

Relator(a): Carvalho Viana

Data de registro: 11/04/2006

Ementa: ARROLAMENTO. Partilha dos bens. Retificação após o trânsito em julgado. Possibilidade. Finado que era titular de parte ideal de imóvel menor que aquela inventariada. Agravo provido.


0009819-30.2001.8.26.0000 Agravo de Instrumento / INVENTÁRIO

Relator(a): Narciso Orlandi Neto

Data de registro: 03/04/2001

Ementa: Inventário - Partilha já julgada - Retificação - Possibilidade - Caso em que herdeiro falecido fora aquinhoado - Herdeiros de acordo - Artigos 1.028 e 1044 do CPC - Agravo provido.


Partilhas sucessivas no inventário conjunto. Outro foco de erros é o inventário conjunto com partilhas sucessivas (falecimento de herdeiro posterior ao dos autores da herança) quando englobadas. A lei exige a individualização porque elas serão registradas na matrícula na ordem cronológica dos falecimentos.


O inventário conjunto é um instrumento perfeito de economia processual, mas quando o filho falece em data posterior aos seus genitores, exige partilhas sucessivas, na ordem cronológica dos óbitos. A relutância dos advogados em respeitar o Princípio da continuidade registral transformou-o numa fonte inesgotável de recursos, abarrotando nossos tribunais de discussões estéreis contra os registradores.

No Tribunal de Justiça de São Paulo é farta e remansosa a jurisprudência recente a favor dos registradores, ou seja, exigindo as partilhas sucessivas. Veja-se:


Inventário[1]:

Decisão que indeferiu a expedição de ofício, bem como determinou a apresentação do plano de partilha, nos termos da nota de devolução do 2º Oficial de Registro de Imóveis de Santos para aditamento do Formal de Partilha. Insurgência. Inadmissibilidade. Pendência de regularização registrária. Quebra da continuidade registral. Decisão mantida. Recurso não provido.

(TJSP; Agravo de Instrumento 2258484-24.2022.8.26.0000; Relator (a): Fábio Quadros; Órgão Julgador: 4ª Câmara de Direito Privado; Foro Central Cível - 8ª Vara da Família e Sucessões; Data do Julgamento: 07/03/2023; Data de Registro: 07/03/2023). (Grifos nossos).


REGISTRO DE IMÓVEIS[2]

DÚVIDA JULGADA PROCEDENTE – FORMAL DE PARTILHA EXTRAÍDO DE INVENTÁRIO CONJUNTO – OFENSA AO PRINCÍPIO DA CONTINUIDADEBENS QUE DEVEM SER PAULATINAMENTE PARTILHADOS – NECESSIDADE DE ADITAMENTO DO TÍTULO PARA CONSTAR DOIS PLANOS DE PARTILHA – RECURSO A QUE SE NEGA PROVIMENTO. (TJSP; Apelação Cível 1023686-87.2021.8.26.0577; Relator (a): Fernando Torres Garcia(Corregedor Geral); Órgão Julgador: Conselho Superior da Magistratura; Foro de São José dos Campos - 8ª Vara Cível; Data do Julgamento: 15/12/2022; Data de Registro: 10/01/2023) (Grifos nossos).


REGISTRO DE IMÓVEIS[3]

DÚVIDA – PARTILHA CAUSA MORTIS – INVENTÁRIO JUDICIAL – Ofensa ao princípio da continuidadeNecessidade de partilhas sucessivas – Impossibilidade de registro – Óbice mantido – Apelação a que se nega provimento.

(TJSP; Apelação Cível 1001379-87.2021.8.26.0562; Relator (a): Ricardo Anafe (Corregedor Geral); Órgão Julgador: Conselho Superior da Magistratura; Foro de Santos - 10ª Vara Cível; Data do Julgamento: 03/11/2021; Data de Registro: 11/11/2021). (Grifos nossos).


REGISTRO DE IMÓVEIS[4] – Dúvida julgada procedente – Ausência de Irresignação parcial – Manutenção dos óbices – Necessidade de partilhas sucessivas – Ofensa ao princípio da continuidade – Recurso a que se nega provimento.

(TJSP; Apelação Cível 1022725-25.2021.8.26.0100; Relator(a): Ricardo Anafe (Corregedor Geral); Órgão Julgador: Conselho Superior da Magistratura; Foro Central Cível - 1ª Vara de Registros Públicos; Data do Julgamento: 20/10/2021; Data de Registro: 11/11/2021). (Grifos nossos).


REGISTRO DE IMÓVEIS – Arrolamento de bens – Ofensa ao princípio da continuidade – Necessidade de partilhas sucessivas – Impossibilidade de registro – Óbices mantidos – Recurso não provido.

(TJSP; Apelação Cível 1031964-58.2017.8.26.0564; Relator(a): Pinheiro Franco (Corregedor Geral); Órgão Julgador: Conselho Superior da Magistratura; Foro de São Bernardo do Campo - 9ª Vara Cível; Data do Julgamento: 19/03/2019; Data de Registro: 25/03/2019). (Grifos nossos).


Ressalte-se ainda que a partilha feita por escritura pública (partilha extrajudicial) admite igualmente a retificação através de outra escritura – escritura de retificação. Essa é a orientação do Conselho Nacional de Justiça:


Art. 13 da Resolução nº 35 do CNJ de 24.04.2007:

A escritura pública pode ser retificada desde que haja o consentimento de todos os interessados. Os erros materiais poderão ser corrigidos, de ofício ou mediante requerimento de qualquer das partes, ou de seu procurador, por averbação à margem do ato notarial ou, não havendo espaço, por escrituração própria lançada no livro das escrituras públicas e anotação remissiva.


O procedimento retificatório é admissível também nos casos de divórcio ou separação judicial, quando da devolução da carta de sentença ou da escritura de divórcio por motivo de erro.


O procedimento de retificação, porém, não se presta à inclusão de bens não inventariados (sonegados, descobertos depois da partilha, litigiosos ou situados em lugar remoto), os quais deverão ser objeto de sobrepartilha - artigo 669 do CPC/2015 (1040 do CPC antigo). Tampouco se presta à solução de acordos ou discussões posteriores ao encerramento da partilha, quanto à divisão dos bens.


Uma vez concluída a partilha e levada a registro, os herdeiros (na sucessão), os ex-cônjuges (na transmissão pelo divórcio) ou ainda os filhos (na doação feita pelos pais no divórcio) serão os legítimos titulares de domínio. Eles poderão dar ao imóvel a destinação que melhor lhes aprouver. Caso queiram vender (entre si ou a terceiros) poderão fazê-lo através de escritura pública registrada. Jamais será admitido o pleito retificatório para tal fim.


Fátima Diniz Castanheira

Advogada especializada em Direito dos Contratos pelo Centro de Extensão Universitária - CEU

Artigo publicado originalmente no Jornal Carta Forense em 12 de março de 2012, jornal esse que foi extinto alguns anos depois. Atualizado e ampliado em 31.07.2023.


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[1] Agravo de Instrumento 2258484-24.2022.8.26.0000 Disponível no site do Tribunal de S. Paulo: https://esaj.tjsp.jus.br/cjsg/getArquivo.do?cdAcordao=16530336&cdForo=0 [2] Apelação Cível nº 1023686-87.2021.8.26.0577 disponível em: https://esaj.tjsp.jus.br/cjsg/getArquivo.do?cdAcordao=16363853&cdForo=0 [3] Apelação Cível 1001379-87.2021.8.26.0562 disponível em: https://esaj.tjsp.jus.br/cjsg/getArquivo.do?cdAcordao=15180514&cdForo=0

[4] Apelação Cível 1022725-25.2021.8.26.0100, disponível em: https://esaj.tjsp.jus.br/cjsg/getArquivo.do?cdAcordao=15180501&cdForo=0


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